Flag of Great Britain Flag of Brazil

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

(Quase) dois meses em Dublin: Casa, trabalho e outras coisas

 

Depois de quase 9 meses de Irlanda, e ainda sem saber que rumos dar para esse ~glorioso~ blog sim, ainda não sei o que fazer, me sinto meio que na obrigação de deixar registrado aqui como tem sido minha adaptação e minha nova vida em Dublin, ainda que isso tenha começado há quase dois meses atrás. A verdade é que estive bem mais ocupado desde que comecei a trabalhar por motivos óbvios! e arrumando uma coisa aqui e outra acolá no tempo livre, ou seja, finais de semana (e ainda querendo escrever primeiro sobre a viagem pra Suíça), o post foi ficando "pra depois" eternamente.

Ainda que eu já tenha entrado numa rotina nessa nova fase, muita coisa aconteceu desde então, e acho que a melhor forma de sumarizar isso é por meio de alguns tópicos. Então, sem mais enrolação, vamos a eles:

Casa

Tive muito receio de não conseguir lidar com meus flatmates aqui, depois de achar o "dono da casa" meio sistemático no dia da entrevista. Tirando o fato de que ele disse que o outro flatmate ser indiano, quando na verdade o cara era boliviano mas com nome, família e cara de francês, não houveram muitas confusões entre a gente. Apesar de sempre haver essa sensação de que ele e a namorada serem os donos da casa (por já morarem aqui há anos, e terem dividido a casa com várias outras pessoas que passaram por aqui), eles são bastante organizados, tranquilos e até bem simpáticos! Não passo horas conversando como fazia com meus flatmates em Galway, mas até uma "sessão" de Pinã Colada meu coquetel favorito já rolou aqui, e a moça vive cozinhando uma sopa típica do país deles e me oferecendo (aliás, eles vivem me oferencendo comida!).

A casa está sempre organizada e limpa. Pelo fato do frio não deixar manter portas e janelas abertas por muito tempo aqui na Irlanda, a quantidade de sujeira/poeira em casa é consideravelmente menor do que no Brasil. Além disso, todo mundo aqui é bem cuidadoso, então ficamos basicamente no rodízio semanal da faxina, normalmente no sábado.

Precisei mudar minha cama de posição, pois minha cabeça ficava colada na parede que divide o quarto e o banheiro, exatamente onde o chuveiro fica conectado. Ele é muito barulhento além de outros barulhos normalmente vindos de lá, então eu acordava TODO DIA com o boliviano/francês tomando banho pela manhã, antes mesmo do meu despertador tocar! No final essa mudança acabou não adiantando muita coisa (o barulho era alto mesmo!), mas o rapaz acabou mudando de casa há algumas semanas, e já que não tem ninguém tomando banho mais pela manhã, meu sono está a salvo.

Aliás, tirando o problema do banheiro, foi uma pena que o cara se mudou. Ele também era super legal, e cheguei a ter alguns papos filosóficos com ele. Ganhei uma caixa de bombom no dia que ele se mudou aparentemente tava escondida em algum canto e ele achou no meio da mudança, e agora temos um novo companheiro de casa, dessa vez um croata aumentando minha lista de estrangeiros conhecidos na Irlanda, um pouco mais na dele, mas também tivemos alguns bons momentos de conversa - como quando ele me contou desse acontecimento que ocorreu próximo do seu país e que desencadeou a Primeira Guerra e, não sei se por ignorância, mas eu nunca tinha ouvido falar.

Trabalho

Esse aqui já valeria um post inteiro, pois assunto não falta. Mas, vamos por partes. Iniciei no novo emprego com mais 4 pessoas, duas no mesmo cargo que eu (mas obviamente em equipes diferentes), e outras duas nos cargos de "criação" dos cursos. Minhas primeiras duas semanas lá foram basicamente apenas para treinamentos, que englobavam TODOS os setores da empresa. Eu achei isso fantástico, dada a minha experiência - e acredito eu, a realidade da maioria das empresas no Brasil - de simplesmente "jogar" o funcionário na suposta realidade do seu futuro dia a dia, e a partir daí, esperar que aconteça o "sevirômetro". Depois disso, trabalhei apenas mais dois dias até minha viagem de final de ano e o recesso da empresa, ou seja, só voltei em Janeiro mesmo. Entretanto algo que eu não esperava bateu em cheio: a complexidade de entender os nativos.

Quem me acompanha aqui sabe que durante todo meu período em Galway o meu uso de português foi limitadíssimo. Usei inglês o quanto pude nos 7 meses em que morei lá. Mas quem leu sobre toda minha experiência lá sabe que meu contato com irlandeses em geral foi também muito pequeno, coisa que tentei resolver de algumas maneiras, e que vira e mexe me questionava. E de repente eu estava lá: tendo contato diariamente com nativos e não-nativos, e ainda com um certo agravante: a empresa possui funcionários de todo o canto da Irlanda (lembrando que mesmo Dublin possui mais de um sotaque, ou seja...), além de gente dos EUA e Inglaterra e de estrangeiros com "English as a second language" da Polônia, Espanha, Itália, e com certeza outros que ainda não fui apresentado. Além disso é comum termos partes do processo de criação dos cursos feitos por empresas e funcionários terceirizados/freelancer da Índia e Canadá. O problema é que toda essa variedade me deixou louco!

Obs: É claro que existem várias pessoas que consigo entender mais claramente, mas sofro pra captar tudo mesmo com alguns integrantes da minha equipe, e isso é bem chato. Pra tentar exemplificar um pouco, esse cara falando (aparentemente um youtuber famoso pela região da Irlanda e Reino Unido que o Youtube insiste em me recomendar quando acesso aqui) me lembra muito como algumas das pessoas lá falam, e sinceramente ele não me parece ser a pessoa mais fácil de se entender (lembrando que o rapaz é britânico e o sotaque é diferente, mas a velocidade e ritmo na fala é o que quero comparar apesar de achar ele até mais fácil de entender).

Me senti muito mal pois, apesar de ter conseguido entender tudo do que foi passado nos treinamentos (obviamente realizado por pessoas diferentes), na hora de rolar algum tipo de conversa eu: (1) não conseguia entender 100% o que as pessoas falavam, fosse por ser muito rápido, ou por usar palavras que eu de fato não sabia o significado; e (2) travar completamente na hora de falar, por medo/receio de errar, e pelo item 1. Isso ACABOU comigo! Sinceramente, fiquei psicologicamente abalado, e chegava em casa arrasado achando que não iria "dar conta do recado". Somou-se a isso a realidade de ter que me comunicar o tempo todo via e-mail e Skype, o que me remetia a ideia de que writing era a skill que eu sempre treinei menos no meu aprendizado do inglês. Não estava sendo fácil!

Conversei com alguns amigos - alguns deles vivendo e trabalhando aqui em Dublin - e nenhum deles disse ter tido o mesmo problema que eu, o que só aumentava minha aflição! Passei a assistir tudo o que eu já assistia antes sem legenda e também cheguei a duas constatações: (1) o sotaque irlandês em geral é mesmo mais difícil de se entender, (2) ainda não consigo entender 100% do que um nativo, mesmo americano (sotaque que sempre estive mais exposto) fala. Isso pode soar como perfeccionismo barato, mas senti na pele que muitas vezes esse percentual faltante pode fazer alguma diferença, e minar minha autoconfiança.

O que posso dizer, depois desses dois meses lá é que boa parte do meu sofrimento passou. Pessoas que eu não entendia uma vírgula do que falavam, hoje já soam razoavelmente mais claras pra mim. Muita gente diz que isso é "acostumar o seu ouvido", e é no que estou acreditando. Minha situação atual portanto é essa: ainda passo aperto, sinto cada dia melhor, mas ainda com problemas, e não sei como resolver isso! Foi engraçado receber o resultado do TOEIC que fiz um pouco antes de terminar as aulas, onde praticamente gabaritei justamente a seção de listening! Ainda penso que, uma vez que sinto um certo progresso, não acho que procurar escola seja uma saída, pois me virar com o que sei foi basicamente o que me trouxe até aqui, e em teoria isso se provaria ser o suficiente... Mas chega da sessão desabafo!

Falando da minha equipe, no geral eles são legais. Existem pessoas mais na delas e outras mais conversadas, mas os perfis dos profissionais envolvidos em uma equipe de criação de e-learning são ainda mais heterogêneos do que em desenvolvimento de software em si, com o que eu estava acostumado. Todos têm sido extremamente prestativos ao compartilhar informações, e pacientes quando preciso de tempo pra entender o que fazer. Outro ponto interessante é que minha equipe é também composta de 2 brasileiros! Somos em 4 no total da empresa, e todos eles têm sido muito legal comigo também. Bem legal mesmo! Almoçamos sempre juntos (como a empresa fica localizada num parque tecnológico no meio do nada distante, não tem restaurante por perto e aí, ou se pede comida pra entregar lá, ou leva de casa, e todos comem na cozinha/refeitório/não-sei-como-chamar). Algo que pode ser meio "polêmico" é que nesse momento todos conversamos em português. Mas claro sempre que tem alguém por perto, giramos a chave e todo mundo por fim se vira no inglês mesmo.

Boa parte das minhas tarefas agora no início está voltada ao teste dos cursos, em diferentes etapas da sua construção. Isso, apesar de ter sido algo muito bem esclarecido na minha contratação, poderia ser algo que me deixasse meio desanimado, já que não é de fato uma atuação voltada à gerência de projetos. Mas iniciar o trabalho dessa maneira tem me permitido ver o processo funcionar, e entender como todas as partes se encaixam. Creio que minha experiência com software tem me ajudado, e já recebi feedbacks positivos.

O ritmo de trabalho é MUITO intenso, daqueles de raramente dar pra abrir o site de notícias pra ver o que tá acontecendo. Após algumas reuniões com a chefe da equipe (uma gerente de projetos sênior), fiquei responsável por algumas tarefas na assistência dos projetos, e na última sexta, após uma ligação pra me apresentar ao cliente não preciso dizer que quase tive 17 ataques cardíacos, ficou definido que a partir dessa semana serei responsável por gerenciar uma sub-parte de um projeto. Aguardemos cenas dos próximos capítulos.

Outras coisas

- Boa parte dos meus amigos coreanos já voltaram pro seu país! Com a diferença de apenas uma semana, encontrei a Boreum e o Paul em um restaurante brasileiro aqui em Dublin (finalmente fomos!) pra despedida dele, e na semana seguinte o Claude (voltando de viagem da Espanha e Portugal) dormiu na minha casa antes de também dar tchau no dia seguinte. Outra a qual falei pouco aqui, a Daoon (namorada do Paul) voltou pra Coréia no último final de semana. Vê-los indo embora assim foi bem chato, mas infelizmente já estava me sentindo longe deles pois estava geograficamente mesmo! assim que vim pra Dublin.

- Ainda não me sinto "cidadão Dubliner". Não sei se por conta de não viver na bagunça muvuca do centro, ou por de fato ter já morado em outra cidade, ou ainda por minha estadia aqui ainda ser de certa forma recente, mas aqui me sinto "na Irlanda" e não "em Dublin". É confuso, deu pra entender? Sei que preciso criar vergonha na cara, e visitar diversos pontos da cidade que sei que são famosos e interessantes, sem falar das cidades ao redor, também conhecidas por serem belíssimas. Além disso, frequentar certos tipos de estabelecimentos que nem haviam em Galway (ou mesmo os que haviam) como teatro, cinema, museus,  etc., devem me fazer conhecer mais a cidade e me sentir mais parte dela. Esse é um plano pra se colocar em prática logo.

- Como já adiantei no último post, estarei de volta ao Brasil em Março (mas apenas por alguns dias)! Após ter feito uma bobeira gigante, acabei perdendo a minha já comprada passagem de volta pro Brasil, que eu comprei quando vim pra cá, e que em teoria estaria usando por agora se não tivesse arrumado emprego. O problema é que me embolei com a data de remarcação dela, e basicamente o assento do avião foi vazio no final de Dezembro, e com ele meu soado dinheirinho. SPOILER: Ainda que a passagem de estudante tenha validade de um ano, a alteração precisa ser feita antes da data de embarque da passagem de volta. Parece óbvio pra mim agora, mas pelo email que recebi da minha agência isso não estava tão claro, e eu acabei me enrolando.

Fiquei muito chateado com isso, pois já estava planejando usar a passagem (em teoria possível até Maio), e foi um dos pontos que usei com minha família pra suavizar a noticia de que ficaria aqui mais um tempo. Mas com o apoio da minha chefe, que me deixou sair 2 semanas de férias e conseguir emendar os únicos 2 feriados possíveis aqui, montei um roteiro louco e daqui a algumas semanas embarco para 11 dias em casa.

Comentei com algumas pessoas que tenho dois receios nessa viagem: ir ao Brasil e não querer voltar pra cá de jeito nenhum, e ir ao Brasil e querer voltar de qualquer jeito. Acho que qualquer uma das duas seria ruim, mas tenho a impressão de que essa viagem vai dizer muito sobre quais serão meus passos pro futuro, seja Brasil, seja Irlanda ou outro lugar, hehe. Mas acho que devo pensar nas coisas boas desse pulo na terrinha primeiro, né? Já estou na contagem regressiva pra dizer: Terra Sol à vista!